Ciência no Jardim
'Desde o momento em que nascemos somos exploradores, num mundo complexo e cheio de fascínio. Para algumas pessoas, o interesse pode desaparecer com o tempo ou com as pressões da vida, mas outras têm a felicidade de mantê-lo vivo para sempre.' Gerald Durrell
Você sabe quanto de carbono seu jardim sequestra?
Como podemos ‘limpar’ nossa atmosfera de todo gás carbônico excedente? Há vários sequestradores de carbono, plantas são um deles. Sendo assim, todo jardim sequestra carbono. Mas, quanto carbono seu jardim sequestra?
Agapanthus africanus ou Agapanthus praecox?
Leigos e viveiristas identificam dois Agapanthus comuns nos jardins como Agapanthus africanus e Agapanthus orientalis. (...) Qualquer Agapanthus designado ‘africanus' no comércio de plantas é quase certamente Agapanthus praecox.
A margarida não é uma só flor
Quem diria que uma das flores mais populares de nossos jardins, a margarida, pertencente à família Asteraceae, e, portanto, parente dos girassóis, crisântemos, entre outras, não é uma só flor, mas a reunião de muitas flores?
Plantas que fogem do jardim
Parece estranho plantas ‘fugirem’ do jardim, mas é isso mesmo. Plantas podem escapar do cultivo reservado do jardim e invadir áreas de florestas e campos naturais, tornado-se uma grande ameça à biodiversidade.
24 de dez. de 2010
A árvore de natal
20 de dez. de 2010
O dia em que não matamos uma serpente
Eu costumava contratar um assistente para ajudar na organização do meu jardim. Ele era um jovem, tinha uns 14 anos, na época. Seu nome era Carlos. Como a maioria das pessoas, ele tinha um medo terrível de “cobras”. Além disso, ele adorava contar casos das muitas “cobras venenosas” que encontrou e matou. Um dia ele estava trabalhando no meu jardim e…
— Encontrei uma “cobra”! Encontrei uma “cobra” — berrou Carlos.
— Onde? Onde? — perguntei, correndo e sua direção, já levando o meu guia de serpentes.
— Aqui! Olha ela aqui! — disse, apontando para um monte de capim — Posso matar? Posso matar? Ela pode “morder” alguém!— rogou, já com a enxada em punho pronto para deferir o golpe mortal .
— Espera! Eu quero ver como ela é — disse.
Olhei com calma. Carlos tinha toda a razão. Lá estava ela, toda enrolada, quietinha, debaixo do capim. Era realmente uma serpente, que erroneamente ele chamava de “cobra”. O correto é serpente. Existe um gênero de serpente chamado Cobra, que vive na Ásia. Mas, ele certamente não prestou muita atenção nas aulas de ciências. Abri o meu guia de serpentes e lá estava ela, a jararaca-dormideira ou come-lesma, uma serpente inofensiva:
— É uma cobra-come-lesma. É um animal inofensivo — disse.
— Não, retrucou ele — É uma jararaca. Ela é venenosa. Vamos matar!
— Não é uma jararaca. É uma come-lesma, como o nome diz ela come-lemas. É inofensiva — insisti.
— Tem certeza? É melhor matar!
— Tenho certeza. E não se diz venenosa, o certo é peçonhenta. A come-lesma não é peçonhenta. Um animal peçonhento é aquela que produz e tem estruturas para inocular a peçonha. Peçonha é a substância tóxica que algumas espécies de serpentes produzem. Esta que você quer matar apenas anestesia a presa com uma droga presente na saliva, ela não produz peçonha e nem tem as presas — expliquei.
— Sério? Mas, ela é preta e branca!
— São desenhos diferentes da jararaca. Olhe! Veja aqui no livro. Esta é uma jararaca e esta é uma cobra-come-lesma. Viu! Elas são diferentes. Olhe, a pobrezinha está dormindo. Durante o dia ela fica debaixo de folhas, galhos, troncos ou pedras dormindo toda enrolada. Durante a noite ela sai para caçar. Por causa, do desenho parecido com o do jararaca e por ficar dormindo de dia, elas são, também, conhecidas pelo nome de dormideira, jararaca-dormideira ou jararaca-preguiçosa.
— Eu já acho tudo igual. Por mim matava. Vai que você olhou errado no livro.
— Não precisa matar, Carlos — disse. Elas são mais comuns agora no período de chuva, quando, também, as lesmas e caracóis são mais comuns. Por este motivo, são conhecidas, também, por come-lesmas ou jararaca-da-chuva. E, por serem comuns nos jardins são às vezes chamadas de cobra-de-jardim.
— Então é mesmo uma “cobra” inofensiva? Não precisa matar. Tem certeza? — insistia, já meio decepcionado.
— Tenho certeza, Carlos! E mesmo que não fosse, não devemos matar um animal apenas porque temos medo dele. Não é mesmo?
— É…tudo bem, esta eu vou deixar viva, mas eu ainda tenho medo de cobras.
Assim, a pequena serpente pôde seguir seu caminho naquele dia. Hoje, Carlos já é um homem feito. Espero que ainda se lembre dessa história, do dia em que ele não matou uma serpente.
M. Eiterer
11 de dez. de 2010
Néctar: água, açúcar e uma pitada de...
À medida que as investigações em torno da interface planta/polinizador progrediam, alguns pesquisadores se voltaram para o estudo da composição química do néctar. Um trabalho pioneiro nessa área foi realizado por Gaston Bonnier (1853-1922), botânico francês que quantificou os diferentes tipos de açúcares presentes no néctar de algumas flores. Boa parte do que sabemos hoje sobre a composição química do néctar deve-se, porém, ao amplo e meticuloso trabalho do casal Baker - os ingleses Herbert G. Baker (1920-2001) e Irene Baker (1918-1989) [1].
Sabemos hoje que o néctar é primariamente uma solução energética, composta de água e açúcares (sacarose, frutose, glicose). Mas não é só isso: trata-se de uma solução energética devidamente temperada... A proporção dos diferentes tipos de açúcar, a concentração de cada um deles e a quantidade total de néctar são algumas das características que variam de acordo com a espécie de planta [2]. E é em parte graças a essa variação que flores de plantas diferentes tendem a atrair conjuntos mais ou menos distintos de polinizadores.
Flores com néctar rico em sacarose, por exemplo, atraem principalmente abelhas, mariposas, borboletas e aves, enquanto flores com néctar rico em frutose ou glicose atraem outras espécies de abelhas e moscas. A concentração de açúcares (i.e., a quantidade de açúcar presente por unidade de volume de água) determina a viscosidade do néctar e isso também influencia a identidade dos visitantes. Abelhas, por exemplo, preferem néctar mais viscoso, enquanto borboletas e beija-flores preferem néctar mais aquoso. Por sua vez, a quantidade de néctar influencia tanto a identidade como o tamanho dos visitantes. Como regra geral, flores que produzem grandes quantidades de néctar atraem os polinizadores de maior porte.
Além de açúcares, sabemos agora que o néctar contém também uma rica e variada gama de substâncias químicas, como aminoácidos, proteínas, lipídios, antioxidantes, minerais e vitaminas, além de algumas toxinas. Mas ainda sabemos relativamente pouco sobre o papel dessas substâncias e suas implicações na polinização. Os aminoácidos, por exemplo, parecem ser importantes como complemento alimentar para animais que necessitam de uma dieta rica em proteínas, como é o caso de borboletas e moscas. Os antioxidantes podem estar presentes a fim de evitar a oxidação e, conseqüentemente, a degradação de outros componentes importantes do néctar. Por sua vez, alguns tipos de proteínas parecem agir na proteção da flor contra o ataque de fungos.
Mas como explicar a presença de substâncias tóxicas no néctar: afinal, por que adicionar toxinas na composição química de um líquido produzido para funcionar como atrativo? Uma explicação plausível, seria a seguinte: a presença de substâncias tóxicas, como ocorre no néctar das flores da datura (Datura, Solanaceae) e do rododendro (Rhododendron, Ericaceae), é um modo de evitar a ação de pilhadores oportunistas. Isso também ocorre com as flores da catalpa (Catalpa speciosa, Bignoniaceae), cujo néctar é rico em toxinas que inibem a ação de formigas nectarívoras, embora essas mesmas substâncias não façam qualquer mal aos legítimos polinizadores.
Para finalizar, um breve comentário antropocêntrico: a presença de algumas dessas outras substâncias no néctar (além de água e açúcar) é responsável pelas diferenças que nós, seres humanos, percebemos no sabor e na cor do mel.
M. Eiterer & Felipe A.P.L Costa*
(*)Felipe A.P.L Costa é biólogo meiterer@hotmail.com, autor de Ecologia, evolução & o valor das pequenas coisas (2003) e A curva de Keeling e outros processos invisíveis que afetam a vida na Terra (2006).
1. Sobre as influências científicas do casal Baker, ver Bock, J. H. & Linhart, Y. B., eds. 1989. Evolutionary ecology of plants. Boulder, Westview Press.
2. Ver Baker, H. G. & Baker, I. 1983. A brief historical review of the chemistry of floral nectar. In: B. Bentley & T. Elias, eds. The biology of nectaries. NY, Columbia University Press.
7 de dez. de 2010
Você sabia que o cheirinho de terra molhada é obra de bactérias?
O dia está quente e, de repente, cai aquela chuva para refrescar. Bastam as primeiras gotas tocarem o solo para sentirmos aquele agradável cheirinho de terra molhada. Um cientista diria: “Huumm, como é bom esse cheirinho de …Bactérias!” é isso aí! O aroma que sentimos vem desses seres microscópicos, que podem ser muito úteis para humanos e até para os…Camelos!
Enquanto bebem a água e saem pingando, os camelos não fazem a idéia, mas dão uma forcinha para as bactérias. É que dessa forma eles espalham os esporos – estruturas produzidas pelas bactérias que vão permitir que elas se reproduzem em outro lugar, algo indispensável para a existência dessa espécie de microorganismo.
Aposto que agora, ao ver um filme com camelos e desertos ou ao passear num jardim molhado e sentir o cheirinho de terra, você se lembrará que existem também bactérias do bem. então, ajude a espalhar essa boa notícia. Afinal, se não fossem esses microorganismos, os camelos poderiam morrer de sede. Já pensou o mundo sem esses curioso animais?
SILVA, Andreza Moura Pinheiro da. Você sabia que cheirinho de terra molhada é obra de bactérias? Revista Ciência Hoje das Crianças, ano 22, nº 202, jun. 2009.
5 de dez. de 2010
Verrugas nas plantas?
Galhas em folha de cambará (Lantana camara). Foto: M. Eiterer |
Galha. Foto: M. Eiterer |
SILVA, Maria Amato Conceição Bueno da. 2001. Verrugas nas plantas! Revista Ciência Hoje das Crianças, nº 110.
29 de nov. de 2010
Sobre néctar e nectário
Uma questão de nomenclatura
M. Eiterer & Felipe A.P.L. Costa
Felipe A.P .L Costa é biólogo, autor de Ecologia, evolução & o valor das pequenas coisas (2003) e A curva de Keeling e outros processos invisíveis que afetam a vida na Terra (2006).
Notas
1. Outras espécies de samambaias também possuem nectários; ver, por exemplo, Koptur, S.; Rico-Gray, V. & Palacios-Rios, M. 1998. Ant protection of the nectaried fern Polypodium plebeium in central Mexico. American Journal of Botany 85: 736-739.
25 de nov. de 2010
Tem um ladrão acrobata no jardim!
Cambacica
Certamente você já viu esse ladrão acrobata no seu jardim. É o pássaro mais comum em jardins e quintais. Ele lembra um bentevizinho. Ele mede aproximadamente 10cm. Seu bico é curvo e afiado. Ele tem sobrancelhas brancas e uma máscara preta cobre os olhos. Seu dorso é cinza-esverdeado, a garganta cinza e a barriga amarela. Este pássaro foi descrito pela primeira vez por Linnaeus em seu 'Systema Naturae' em 1758. Seu nome científico é Coereba flaveola ( Coerebidae).
Ele é conhecido, no Brasil, pelos mais diversos nomes, como: cambacica, mariquita, chupa-mel, chiquita, caga-sebo, cabeça-de-vaca, sebito, guriatã-de-coqueiro, sebinho, papa-banana, saí e tem-tem-coroado. A fêmea e o macho são muito parecidos, sendo o macho, apenas, um pouco maior. O macho canta sem cansar. Podemos ouvir seu canto a qualquer hora do dia e época do ano. A fêmea também canta, mas pouco e por menos tempo.
São brigões como os bem-te-vis. O alimento principal do cambacica é o néctar. Mas, ele também come frutas e insetos. Com o bico curvo e afiado ele perfura o cálice de flores, cujos nectários, ele não pode alcançar, deixando de realizar o trabalho de polinizar as flores. É comum vê-lo perfurando o cálice do malvavisco (Malvaviscus arboreus), de grandes flores vermelhas pendentes. É, por este motivo, conhecido como um ladrão de néctar. Explora flores de tamanhos e formas muito variadas. Consegue ficar de cabeça para baixo agarrando-se com as unhas afiadas, para conseguir alcançar as flores. Acrobacia semelhante fazem as saíras (Thraupidae). Por causa do néctar pegajoso, toma banho com freqüência. Limpa o bico passando-o de um lado para o outro num galho.
O cambacica constrói seu ninho sobre arbustos, a poucos metros do chão. O ninho tem a forma de uma bola. Interessante é que o cambacica constrói dois tipos de ninhos, um ninho menor de construção frouxa, apenas para dormir. O outro ninho, bem acabado, de paredes espessas e acesso pequeno, entrada com alpendre, construído pelo casal para a reprodução. Os ovos são pequenos (4 cm de diâmetro), brancos manchados de marrom. A incubação dos ovos é tarefa exclusiva da fêmea e dura 13 dias. Os filhotes nascem cegos e sem penas. Os filhotes são alimentos com insetos regurgitados pela fêmea. A mãe também cuida da higiene do ninho, ela ingere os sacos de fezes dos filhotes ou carrega-os para longe. Os filhotes saem do ninho com 19 dias. O jovem cambacica é um pouco diferente do adulto, não tem as sobrancelhas brancas e a máscara preta, seu dorso é cinza e o ventre amarelo. Movimenta-se com certa dificuldade, mas já consegue dar pequenos vôos, sempre acompanhado por um dos pais.
Agora que você conhece melhor o cambacica, eu tenho certeza que você irá prestar mais atenção nele, quando ele aparecer no seu jardim.
M. Eiterer
Fonte
SICK, Helmut. Ornitologia brasileira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.
23 de nov. de 2010
Segredos do florescimento
Segredos do florescimento
As primeiras angiospermas (ou plantas com flores) surgiram há uns 130 milhões de anos. Cerca de 230 mil espécies diferentes de angiospermas já foram formalmente descrita e nomeadas pelos botânicos. Assim como ocorre com os seres humanos, as plantas também passam por fases ou estágios de desenvolvimento.
Nas plantas, no entanto, as mudanças de fase não provocam alterações em todo o corpo do organismo, mas apenas em certas regiões, notadamente no ápice do caule, onde está localizado o meristema apical. O ápice do caule passa por três fases: juvenil, vegetativa e reprodutiva. É na fase reprodutiva que a planta passa a produzir flores. A flor nada mais é do que um ramo de crescimento efêmero, ornado com "folhas especiais" que servem para a reprodução sexuada - i.e., a produção de descendentes geneticamente distintos. Mas o que faz com que uma planta floresça, passando assim da juvenilidade para a maturidade?
A floração é um evento complexo. Sob determinadas circunstâncias, a planta recebe um sinal de que está na hora de florescer. Esse sinal pode ser de origem interna (da própria planta) ou externa (do ambiente em que a planta cresce). Os sinais internos podem ter a ver com a idade, tamanho ou número de folhas que a planta sustenta. Os sinais externos mais comuns são o comprimento do dia [1] ou a temperatura [2].
As folhas e raízes são os órgãos normalmente envolvidos com o reconhecimento desses sinais. O sinal adequado induz a planta a produzir determinada resposta, que pode ser traduzida por uma aumento na concentração de um ou outro sinalizador químico. Quando chega no lugar apropriado - no caso, o ápice caulinar -, o sinalizador químico termina evocando [3] a floração. Uma planta pode precisar de mais de um sinal, mais de uma resposta química e percorrer vários caminhos até conseguir evocar a floração. Quando a evocação ocorre, o meristema apical deixa de produzir folhas e passa então a produzir flores.
Até as primeiras décadas do século 20, acreditava-se na existência de um "florígeno", uma substância que induziria qualquer planta a florescer. Hoje sabemos que não existe um florígeno ou um anti-florígeno universal; ao contrário, sabemos que há vários inibidores e promotores (o etileno promove a floração do abacaxi) e, vários caminhos até a floração. Não é de estranhar; afinal, as angiospermas colonizaram e se reproduzem nos mais diversos hábitats do planeta.
Algumas plantas ornamentais são comercializadas floridas, a despeito da época do ano, como é o caso de crisântemos (Dendranthema grandiflorum), calânchoes (Kalanchoe blossfeldiana), poinséteas (Euphorbia pucherrima) e íris (Neomarica caerulea). Isso, no entanto, só é possível por causa de pesquisas que buscam descobrir os segredos do florescimento, permitindo assim recriar de forma artificial as condições necessárias para evocar a floração dessas espécies durante todo o ano.
M. Eiterer
Notas:
1-As plantas reconhecem e respondem a diferenças no comprimento do dia (dias longos e noites curtas no verão contra dias curtos e noites longas no inverno), por isso algumas plantas florescem no inverno e outras no verão.
2-Agumas plantas precisam receber baixas temperaturas por um período para florescerem.
3-Vocação e um termo semelhante a induzir, mas nesse caso refere-se a mudanças no ápice caulinar que provocam a produção de flores.
22 de nov. de 2010
Quanto tempo vive uma flor?
De fato, algumas flores abrem e murcham em questão de horas. A flores da "glória-da-manhã" (Ipomoea purpurea), por exemplo, permanecem abertas por apenas uma manhã. No outro extremo do espectro, estão as flores de algumas espécies de orquídeas que duram algumas semanas. Como os botânicos explicam toda essa variação na longevidade floral?
A flor é uma estrutura reprodutiva. Nela estão os órgãos sexuais masculinos e/ou femininos. Na maioria das plantas, as flores possuem estruturas reprodutivas dos dois sexos, mas em outras elas estão em flores distintas ou mesmo em plantas individuais diferentes. A antera é o órgão floral responsável pela produção do gameta masculino e seu empacotamento, formando o grão de pólen. Os grãos de pólen produzidos por uma flor precisam viajar até outras flores. Nessa viagem o pólen pode ser transportado por insetos (abelhas, borboletas, mariposas, besouros, vespas etc), aves (beija-flores), mamíferos (morcegos etc) ou por agentes físicos (vento, água).
A viagem dos grãos de pólen pode ser rápida ou longa, estando eles programados para sobreviver a essa jornada. O ovário é o órgão responsável pela produção dos óvulos que contém os gametas femininos. O estigma é a estrutura receptora de pólen. O grão de pólen deverá cair sobre o estigma, onde terá condições de germinar, para penetrar no tecido estigmático e alcançar o óvulo, dentro do ovário e fertilizá-lo. Após a fertilização, o ovário passa por transformações e passa a ser chamado de fruto, onde se desenvolvem as sementes, que eventualmente darão origem a novos descendentes.
A longevidade floral é o período de tempo durante o qual a flor permanece aberta e funcional, podendo então dispersar e/ou receber grãos de pólen. Algumas plantas aceitam o "casamento entre irmãos" - i.e., ela aceita que os óvulos sejam fertilizados pelo seu próprio pólen. Outras, no entanto, não aceitam e esperarão pela chegada de pólen vindo de outro indivíduo. O segundo caso pode ser mais demorado e, por conta disso, a flor pode permanecer aberta e funcional por um período mais longo. Em contrapartida, isso implica no aumento da variabilidades entre a prole, o que pode ser biologicamente vantajoso.
Esse comportamento de sustentar flores por mais tempo pode ter contribuído para que certas famílias, como as orquídeas e as asteráceas (margarida, dália, girassol etc.), tenham se tornado particularmente numerosas e diversificadas. A flor não é um órgão fotossintético, sendo basicamente uma estrutura importadora de recursos produzidos e elaborados nas partes vegetativas da planta (folhas, raízes, caule). Isso impõe limites ao modo como as plantas equilibram a produção de mais flores novas frente à manutenção de flores velhas por mais tempo.
O próprio lugar onde a planta vive pode favorecer o surgimento de plantas que produzem flores que vivem muito tempo. Em lugares onde os polinizadores são raros, como em altas altitudes, as flores podem viver mais tempo, à espera de grãos de pólen trazidos por algum visitante. As atividades humanas podem, ainda, interferir em todo esse cenário. Hábitats fragmentados, por exemplo, podem aumentar ainda mais a raridade de polinizadores especializados e que já são naturalmente raros. Se o "casamento" não ocorre, as sementes não são formadas e a população de plantas pode diminuir ainda mais de tamanho.
Se você quiser saber qual é o tempo de vida de suas flores preferidas, amarre uma linha colorida (linha de bordar ponto cruz, por exemplo) em alguns botões (se necessário, use linhas de cores diferentes para identificar botões individuais). Quando eles abrirem, registre a data e monitore o que acontece nos dias subseqüentes. Fique atento, pois o tempo exato de duração pode variar mesmo entre flores de uma mesma planta e/ou as condições de crescimento. No fim das contas, esse é apenas mais um capítulo do trabalho dos botânicos que buscam desvendar os mistérios do mundo das flores.
M. Eiterer
Flores que mudam de cor
São plantas que produzem flores de duas cores ou são flores que mudam de cor?
Algumas das plantas mais comumente cultivadas em jardins domésticos são admiradas por um motivo bastante curioso: suas flores mudam de cor. Esse é o caso do Cambará (Lantana camara, Verbenaceae), da Papoula-de-duas-cores (Hibiscus mutabilis, Malvaceae), do Manacá-da-serra (Tibouchina mutabilis, Melastomataceae) e do Manacá-de-cheiro (Brunfelsia uniflora, Solanaceae). Nessas e em muitas outras espécies, é bom frisar, as plantas não produzem flores de cores diferentes. São as flores que mudam de cor ao longo do seu tempo de vida. Eventos florais desse tipo só podem ser percebidos mais claramente quando o observador acompanha o destino de flores individuais.
A mudança de cor é um fenômeno relativamente comum entre as angiospermas. Ocorre enquanto a flor ainda é jovem, não devendo tal mudança ser confundida com a perda de cores e o escurecimento que acompanham o processo de senescência. Em termos funcionais, são conhecidos ao menos sete diferentes mecanismos associados à mudança de cor das flores, envolvendo três grandes classes de pigmentos vegetais (carotenóides, flavonóides e betalaínas).
Carotenóides, flavonóides e betalaínas são compostos secundários que, além de dar cor a flores e frutos, têm outras importantes funções biológicas. As betalaínas são responsáveis por um leque de cores (amarelo, alaranjado, vermelho, rosa, púrpura), sendo encontradas porém apenas em plantas da ordem Caryophyllales. Como exemplos, podemos citar a Rosinha-de-sol (Aptenia cordifolia, Aizoaceae), Periquito (Alternanthera ficoidea, Amaranthaceae), Três-marias (Bougainvillea spectabilis, Nyctaginaceae), Onze-horas (Portulaca grandiflora, Portulacaceae), Beterraba (Beta vulgaris, Chenopodiaceae) e os cactos em geral (Cactaceae).
Os carotenóides são responsáveis por um leque semelhante de cores (amarelo, alaranjado, vermelho, marrom), sendo encontrados na cenoura, tomate, laranja, pimenta e nas flores do Cravo-de-defunto (Tagetes erecta, Asteraceae). Por fim, temos os flavonóides, responsáveis pela maioria das cores observadas em flores e frutos (amarelo, alaranjado, vermelho, azul). As antocianinas são o grupo mais comum de flavonóides.
As betalaínas e antocianinas não co-ocorrem em uma mesma planta. Quer dizer, plantas que têm antocianina não possuem betalaína, e vice-versa. Flavonas e flavonóis também são grupos de flavonóides encontrados em flores, principalmente nos chamados guias de néctar. Esses pigmentos absorvem certos comprimentos de luz que são invisíveis ao olho humano, mas que são visíveis para outros animais (muitos insetos, por exemplo). De todos os mecanismos bioquímicos e fisiológicos associados com a mudança de cor das flores, a manifestação da antocianina é o mais comum deles.
Fatores ambientais, como diferenças no pH do solo, podem levar a mudanças na coloração das flores. Essas mudanças também podem ser pré-programadas, como ocorre com a Pata-de-vaca (Bauhnia monandra, Leguminosae). A flor jovem da pata-de-vaca é esbranquiçada, com uma grande mancha vermelha no meio da pétala central; em determinado momento da vida da flor, no entanto, a pétala central curva-se para trás, como querendo se esconder. Após a conclusão desse movimento, todas as demais pétalas tornam-se rosa. Assim, o que no início era uma flor branca com uma grande mancha vermelha em uma das pétalas transforma-se em uma flor uniformemente rosa.
Descrever os mecanismo pelos quais as flores mudam de cor é um dos objetivos dos estudiosos que lidam com o assunto. Resta, no entanto, um outro, ainda mais complexo e difícil: identificar as pressões seletivas que teriam favorecido a evolução de tal comportamento.
M. Eiterer
21 de nov. de 2010
Você sabia que a margarida não é uma só flor?
Você sabia que a margarida não é uma só flor?
A margarida, uma reunião de muitas flores. Foto: M. Eiterer |
Marinês Eiterer gosta de plantas e jardins desde criança. Por isso foi estudar biologia. Plantou tantas árvores que perdeu a conta. Hoje identifica plantas e escreve sobre elas. |