"Desde o momento em que nascemos somos exploradores, num mundo complexo e cheio de fascínio. Para algumas pessoas, o interesse pode desaparecer com o tempo ou com as pressões da vida, mas outras têm a felicidade de mantê-lo vivo para sempre."
Gerald Durrell

Ciência no Jardim

'Desde o momento em que nascemos somos exploradores, num mundo complexo e cheio de fascínio. Para algumas pessoas, o interesse pode desaparecer com o tempo ou com as pressões da vida, mas outras têm a felicidade de mantê-lo vivo para sempre.' Gerald Durrell

Você sabe quanto de carbono seu jardim sequestra?

Como podemos ‘limpar’ nossa atmosfera de todo gás carbônico excedente? Há vários sequestradores de carbono, plantas são um deles. Sendo assim, todo jardim sequestra carbono. Mas, quanto carbono seu jardim sequestra?

Agapanthus africanus ou Agapanthus praecox?

Leigos e viveiristas identificam dois Agapanthus comuns nos jardins como Agapanthus africanus e Agapanthus orientalis. (...) Qualquer Agapanthus designado ‘africanus' no comércio de plantas é quase certamente Agapanthus praecox.

A margarida não é uma só flor

Quem diria que uma das flores mais populares de nossos jardins, a margarida, pertencente à família Asteraceae, e, portanto, parente dos girassóis, crisântemos, entre outras, não é uma só flor, mas a reunião de muitas flores?

Plantas que fogem do jardim

Parece estranho plantas ‘fugirem’ do jardim, mas é isso mesmo. Plantas podem escapar do cultivo reservado do jardim e invadir áreas de florestas e campos naturais, tornado-se uma grande ameça à biodiversidade.

14 de nov. de 2011

O que nos tornou humanos?

"A pergunta é antiga: de onde viemos? Os gregos da Antiguidade diziam que as formas tinham sido moldadas pelos deuses com a argila. Hoje sabemos que nossos corpos foram moldados por selação natural e que viemos da África. No passado distante, muito antes que as pessoas começassem a escrever, a lavrar o solo ou a usar barcos, nosso ancestrais viviam ali como caçadores-coletores. Ossos fossilizados revelam que temos parentesco com africanos que viveram um milhão de anos atrás, ou mais. E eram pessoas com uma aparência muito semelhante à que temos hoje. Nas rochas mais profundas, porém, os registros de nossa humanidade vão diminuindo até por volta de 2 milhões de anos atrás, quando dão lugar a ancestrais pré-humanos e nos deixam com uma questão que cada cultura responde de uma maneira diferente, mas somente a ciência pode verdadeiramente decidir: o que nos tornou humanos?

(...). Acredito que o momento da transformação que deu origem ao gênero Homo, uma das grandes transições na história da vida, brotou do controle do fogo e do advento de refeições cozidas. O cozimento aumentou o valor da comida. Ele mudou nossos corpos, nosso cérebro, nosso uso do tempo e nossas vidas sociais. Transformou-nos em consumidores de energia externa e assim criou um organismo com uma nova relação com a natureza dependente de combustível.
(...)"



Fonte da foto: Wikipedia

WRANGHAM, Richard. Pegando fogo: porque cozinhar nos tornou humanos. Jorge Zahar: Rio de Janeiro, 2010.


20 de out. de 2011

As várias formas de apresentar o pólen ao polinizador


A função primária da antera é a produção de grãos de pólen. Trata-se, assim, de um órgão doador de gametas. Depois que é produzido e atinge a maturidade, o pólen deve seguir viagem até o estigma, órgão feminino que tem a função de receber o pólen. Lá chegando, e tudo correndo bem, o pólen germinará, formando um tubo - o tubo polínico - por onde o gameta masculino penetrará até alcançar o gameta feminino, que se encontra protegido dentro do óvulo, no interior do ovário. A fecundação do óvulo pelos grão de pólen resulta na formação de sementes (i.e., novos descendentes).

Sair da antera de uma flor e chegar ao estigma de outra não é uma viagem sem riscos, mesmo para esse pacote resistente e durável, que transporta o gameta masculino, chamado grão de pólen. Essa viagem - a polinização - pode durar alguns segundos ou mesmo dias, e cada espécie produz seus grãos de pólens adaptados a essas variações. Para iniciar sua viagem e alcançar seu objetivo, o pólen precisa contar com a ação de algum agente transportador de pólen - i.e., um dispersor.

O vento e a água funcionam como agentes dispersores de pólen para muitas espécies de plantas. O mais comum, no entanto, é que o agente dispersor seja algum animal, como abelhas, besouros, borboletas, morcegos ou beija-flores. Para que esses animais dispersores - também chamados de vetores - cheguem até o pólen, este precisa estar situado em alguma região visível ou facilmente detectável. A principal estrutura da flor que apresenta o pólen ao seu dispersor é a própria antera. Em muitas espécies, a antera se abre longitudinalmente, expondo o pólen aos visitantes. Em outros casos, o animal retira os grãos de pólen através de pequenos orifícios nas anteras. Esse é o caso, por exemplo, de abelhas que vibram agarradas sobre as anteras e, desse modo, têm acesso a pequenas quantidades de pólen. Nesses casos, como o apresentador é a própria antera, dizemos que a apresentação de pólen é primária.

Em muitas outras espécies de plantas, no entanto, nas quais a apresentação de pólen é um processo mais especializado, outras estruturas assumem o papel de apresentador. O pólen continua a ser produzido nas anteras, sendo posteriormente transferido para outra estrutura floral, como filete, estilete ou pétalas, ainda na fase de botão. Essas estruturas possuem adaptações especilizadas para reter os grãos de pólen, como a epiderme recoberta de papilas ou pêlos. A antera mantém sua função primária de produzir o pólen, mas deixa de exercer a função de apresentá-lo. Esse tipo de apresentação é conhecido como apresentação secundária de pólen. Um exemplo familiar em jardins pode ser visto na Giesta (Spartium junceum, Leguminosae: Papilionoideae), na qual o pólen é depositado sobre os filetes da antera, que ficam assim armados como pequenas catapultas. Quando o dispersor toca na flor, o estame desarma e o pólen é lançado sobre ele. Outras plantas de jardim que exibem uma apresentação secundária de pólen são a Cana-da-índia (Canna denudataC. x generalisC. limbata; Cannaceae) e as Ixoras (Ixora chinensisI. coccineaI. macrothyrsa; Rubiaceae).

Os estudiosos ainda divergem entre si no que diz respeito ao número de famílias botânicas que abrigam espécies com apresentação secundária, mas esse número seguramente está próximo de trinta. O pólen é um investimento caro e de grande valor para a planta, já que armazena o gameta masculino. Por isso mesmo, as principais hipóteses para explicar as funções e a evolução da apresentação secundária de pólen argumentam que tal comportamento poderia ser um modo de minimizar os custos da produção, pois tornaria a polinização um processo mais eficiente e exato; a planta também economizaria pólen, pois na apresentação secundária apenas pequenas quantidades de pólen são apresentadas de cada vez, aumentando assim as chances de que mais de um dispersor transporte seu pólen. Além disso, a apresentação secundária evita que o órgão masculino interfira no funcionamento do feminino e vice-versa.

Aparentemente perfeita, a arquitetura da flor tem lá os seus problemas. Não é à toa, portanto, que ao longo da história evolutiva das angiospermas, as flores têm incorporado mecanismos cada vez mais sofisticados no sentido, ao que parece, de contornar ao menos alguns desses problemas.

M. Eiterer

4 de out. de 2011

O perfume das flores


Plantas produzem muitas substâncias que funcionam como mediadores entre plantas e animais, algumas dessas substâncias servem para repelir herbívoros,  outras para atrair polinizadores. 

Substâncias repelentes geralmente são encontradas nas folhas. A planta precisa evitar que suas folhas sejam comidas, pois são elas que fazem fotossíntese. Repelentes atuam sob contato. Encostou ou deu uma mordida a folha libera uma substância repelente. Exemplos são as folhas de manjericão, hortelã, laranja e limão. As folhas produzem substâncias repelentes em uma grande variedade de estruturas. 


Já as flores produzem perfume para atrair polinizadores. O perfume das flores são produzidos em osmóforos (osmo=odor foros=produz; área do tecido floral especializada na emissão de cheiro) geralmente presentes nas pétalas, mas estruturas como os estames, também podem produzir perfume. O perfume só é liberado em determinadas condições. Repelentes e perfumes florais podem ter uma origem evolutiva comum, pois as estruturas florais são homólogas com folhas.

Para descobrir se uma flor produz perfume ou qual estrutura da flor produz o perfume, podemos fazer uma experiência bem simples:



Material
*4 vidros com tampas
*canetas de retroprojetor
*pinça
*flores frescas

Como fazer
1) Colocar 3 a 4 flores em cada vidro e tampe. Aguarde cerca de 30 minutos e abra o vidro. Tente sentir o cheiro que exala do vidro. Se não há cheiro pode ser que a flor não produz perfume ou ela emite o perfume em determinado horário, e.g., durante a noite.
2) Mas qual parte da flor emite o perfume? Será que é a corola? Os estames? Para saber qual parte da flor exala o perfume teremos que separar as partes da flor e colocar cada parte em um vidro separado. Para que o cheiro fique bem concentrado dentro do vidro use mais de uma flor.
M. Eiterer

21 de ago. de 2011

Toninho e a jararaca

Moro na rua dos Antônios. São tantos Antônios que eles são identificados pelos nomes das esposas, como o Antônio da Vanda, por exemplo. Outros pelo apelido como o Totó. Um desses Antônios é o Toninho. Um jovem senhor de 89 anos, que vive correndo de um lado para o outro com seu fusquinha branco. No ano passado ele foi picado por uma jararaca. Ele está bem. Foi ele que me contou essa história.

A casa do Toninho é uma casa antiga, com porão e piso de madeira. Para não dar cheiro de mofo na casa ele cobre o piso do porão com folhas de eucalipto. Mas, periodicamente ele tem que trocar as folhas que perdem o cheiro. Numa dessas trocas ele desceu até o porão. E, vá saber lá porque, nesse dia ele não estava com seu velho par de botas. Ele foi puxando as folhas e juntando num monte. Uma jararaca dormia no porão no meio das folhas.  Como o porão é escuro o  Toninho não viu a jararaca e puxou a bichona junto com as folhas.  A jararaca despertou e percebendo o perigo armou e deu o bote na perna desprotegida de Toninho. Ele viu a jaracaca, mas não teve tempo de se safar. A picada já estava dada. Ele precisava agir rápido. Pegou uma ferramenta que estava à mão e acertou a jararaca. Pegou a bicha e levou para fora. Correu até a casa. Chamou a esposa e avisou do acontecido. Precisa ir urgente ao hospital. Chamaram um dos filhos que foi dirigindo. Ele já sentia as dores do efeito do veneno na perna. Rapidamente chegaram ao hospital ele foi atendido e medicado. Por muitos meses ele ficou sentindo a perna, mas pouco tempo depois lá estava ele correndo prá lá e prá cá com seu fusquinha.

No final da nossa conversa perguntei ao Toninho: -Quantas serpentes o senhor já viu na vida? -Muitas. Quando era jovem era mais comum encontrar serpentes. Hoje nem tanto. -E, quantas vezes o senhor foi picado? -Só dessa vez. -E, porque o senhor acha que foi picado? -Estava descalço num lugar onde cobras podem se esconder. Fui incalto.

M. Eiterer


21 de jul. de 2011

Teia de raízes

O que habitualmente admiramos em uma planta, é apenas a ponta de um grande iceberg. As plantas não têm apenas uma raiz, mas sim um intrincado sistema de raízes. 

De um modo geral, o raio ocupado pelas raízes de uma planta é de quatro a sete vezes maior que o raio ocupado pela sua parte aérea. Se pudéssemos enxergar através do solo, o que veríamos seria uma gigantesca teia de raízes sob nossos pés, abastecendo de água e nutrientes a parte do corpo da planta que admiramos na superfície.

As raízes exercem funções de absorção, condução de água e sais minerais, reserva e fixação da planta. A primeira raiz, ou raiz primária, de uma planta tem origem ainda na fase embrionária. 

A raiz primária pode continuar crescendo e se ramificar, formando um sistema radicular pivotante, profundo (1) ou superficial. Contudo, em algumas plantas, como nas gramíneas, a raiz primária tem vida curta e logo é substituída por inúmeras raízes adventícias. As raízes deste último tipo têm origem no caule e formam um sistema radicular fasciculado (2), um emaranhado de raízes que ficam na superfície do solo. 

Esses são os sistemas radiculares mais comuns entre as plantas (excluindo samambaias e espécies relacionadas). Algumas raízes, ou parte delas, tornam-se altamente especializadas em determinada função como armazenamento (cenoura), escoramento (Pandanus), fixação (filodendros) etc.

As raízes crescem em extensão a partir do ápice, pois é lá que estão concentradas as células-tronco(3) da raiz. É por isso que devemos ter tanto cuidado para não quebrar a ponta das raizes. Para proteger essa região delicada, ao mesmo tempo em que a raiz penetrando no solo, o ápice das raizes é coberta por um envoltório (4), que também controla a direção do crescimento (descendente ou em sentido contrário ao da luz). 

Como nas árvores, além do crescimento em extensão, as raízes também crescem em diâmetro (5). Alguns dos fatores que influenciam o crescimento das raízes, tanto em diâmetro como em profundidade, são a umidade, a temperatura e a composição do solo. As raízes podem ser danificadas pelo frio, seca, parasitas, patogênos, entre outros. Danos na parte aérea podem afetar as raízes e vice-versa. Quando se arranca uma planta, grande parte dos pêlos absorventes das raizes, responsáveis pela absorção de água e sais minerais, são perdidos.

No planejamento de um jardim, devemos tentar prever o crescimento das raízes, evitando assim problemas futuros com áreas edificadas, como piscinas e muros, além de estruturas subterrâneas, como a rede de água, luz e esgoto. O local escolhido para o plantio deve ter espaço suficiente para que a água e os nutrientes retornem ao solo constantemente e em quantidade suficiente para a manutenção da saúde da planta. É por isso que devemos evitar a impermeabilização do entorno de árvores, uma prática, infelizmente, ainda comum nas calçadas de muitas cidades. 

Lembre-se: as plantas não são responsáveis pelos estragos causados em calçadas, muros e outras edificações humanas, mas sim quem plantou mudas sem oferecer a elas as condições mínimas de desenvolvimento.


Notas:
(1) A maior raiz que se tem registro media 53 metros de profundidade.

(2) Fasciculado (do latim fasciculatus): que surgem de um mesmo local.

(3) Células com capacidade indefinida de divisão celular. Em botânica é mais comum o uso do termo células iniciais.

(4) O nome técnico para designar esse envoltório é coifa.

(5) Tecidos especiais, chamados de meristemas laterais, são os responsáveis pelo crescimento secundário das raízes.


M. Eiterer




5 de jul. de 2011

Néctar colorido


O nectário é uma estrutura secretora, que secreta néctar. Ele está presente nas flores ou em partes vegetativas, como folhas. Ele é oferecido como recompensa pelos serviços de polinização, prestados por alguns animais. No entanto, a produção de néctar é dispendiosa para a planta, o volume produzido por uma planta pode consumir até 37% de toda a sua produção fotossintética diária. Logo, néctar tem um importante papel nas interações entre planta e polinizador. Dessa forma, ele está sujeito a pressões seletivas, que podem ser impostas pelos próprios polinizadores, favorecendo, portanto, o surgimento e a manutenção de determinadas características, como por exemplo, cor.

Néctar é comumente caracterizado como sendo um líquido incolor. Contudo, a existência de néctar colorido já era conhecida desde a antiguidade, citado por Homero, em Ilíada (Livro XIXX, versos 37-39). Mas, ele só veio a ser descrito pela primeira vez pela ciência em 1785, pelo sueco Andreas Hesselius (1677-1733), na descrição de uma espécie de Aloe. Outras espécies foram descritas desde então, algumas com interpretações equivocadas ou publicadas sem o devido enfoque, ou em revistas obscuras.
Nesocodon mauritianus, produz néctar de cor vermelha.
Quase dois séculos depois do primeiro relato de Hesselius, uma espécie endêmica e ameaçada das Ilhas Maurício, Nesocodon mauritianus (Campanulaceae), foi descoberta e descrita pelo botânico irlandês Peter Wyse Jackson, no entanto a cor vermelha do seu néctar passou despercebida de Jackson. Em plantas herborizadas o néctar seco é de difícil interpretação, pois pode parecer apenas uma mancha colorida sobre a corola. A cor do néctar só pode ser percebida em plantas vivas. Entretanto, essa seria a espécie que despertaria a atenção dos botânicos para essa intrigante e peculiar característica do néctar.

Assim, 14 anos depois da descrição de Jackson, de Nesocodon mauritianus, Jens M. Olesen e outros, da Universidade de Aarhus, na Dinamarca, estudavam populações dessa espécie, nas Ilhas Maurício e cultivaram a espécie na Universidade de Aarhus. Foi então que descobriram que a cor do néctar  de Nesocodon mauritianus era vermelha e decidiram investigá-lo. Nessa época os pesquisadores acreditavam que essa era a única espécie com néctar colorido no mundo e que tal fato só ocorria nas Ilhas Maurício. Mas, Dennis M. Hansen, da Universidade de Zurique, na Suíça e colaboradores revisaram o assunto e descobriram que outras espécies de plantas em outras partes do planeta produziam néctar colorido. No Brasil, é conhecida apenas uma espécie que secreta néctar de cor azul, Schwartzia brasiliensis (=Noranteia brasiliensis, Marcgraviaceae).

Graças ao trabalho unificador de Hansen, sabemos hoje que néctar colorido surgiu independentemente e repetidamente em diferentes regiões geográficas, tropicais e subtropicais, em 68 taxas, 20 gêneros e 15 famílias de 13 ordens de angiospermas. Para os pesquisadores da Universidade de Zurique, esse padrão de convergência sugere a possibilidade de uma pressão seletiva comum, como a necessidade de um sinal honesto para os visitantes, permitindo que eles avaliem a quantidade de néctar na flor, antes de visitá-la e dessa forma ajustar seu comportamento. Os polinizadores observados em algumas dessas espécies são vertebrados. Aves, em Aloe e Schwartzia brasiliensis e, lagartos (Phelsuma), em Trochetia boutoniana (néctar vermelho) e, Trochetia blackburniana (néctar amarelo). 

Além de transparente, o néctar pode ter as cores: amarelo, azul, laranja, marrom, preto, vermelho e verde devido a presença de compostos secundários na sua composição química como: aurone em Nescodon mauritianus e antocianina Schwartzia brasiliensis. Compostos secundários podem mudar não só aparência, mas também o gosto e digestibilidade do néctar. Contudo, a função do néctar colorido nas outras espécies ainda não está esclarecida. Novas pesquisas devem ser conduzidas com outras espécies, para podermos entender a função e a evolução do néctar colorido.

M. Eiterer
Fontes
OLESEN, J. M., RØNSTED, N., TOLDERLUND, U., CORNETT, C., MØLGAARD, P., MADSEN, J., JONES, C.  G.  &  OLSEN, C. E. 1998. Mauritian red nectar remains a mystery. Nature 393: 529.
HANSEN, D. M.; OLESEN, J. M.; MIONE, t.; JOHNSON, S. D. & MÜLLER, C. B. 2007. Coloured nectar: distribution, ecology, and evolution of an enigmatic floral trait. Biological Reviews vol. 82, pp. 83-111.
SAZIMA, I., BUZATO, S. & SAZIMA, M. (1993). The bizarre inflorescence of Norantea brasiliensis (Marcgraviaceae): visits of hovering and perching birds. Botanica Acta 106, 507–513.



10 de jun. de 2011

O aquecimento global e as plantas



Terra. Fonte da foto: wikipedia






A temperatura da Terra está subindo e a emissão de gases-estufa, provenientes de atividades humanas (como a queima de combustíveis fósseis e as queimadas), é a principal dessa elevação. Segundo cálculos dos climatologistas, a temperatura média da atmosfera deve subir entre dois e seis graus centigrados até o fim do século 21. Pode parecer pouco, mas já seria o suficiente para provocar conseqüências desastrosas em escala planetária.

Um dos efeitos mais diretos do aquecimento global seria a elevação no nível do mar e a inundação de cidades e comunidades litorâneas. Mas muitos outros efeitos são esperados, como o aumento na intensidade de certos fenômenos naturais, como furacões, inundações e secas, e o aumento na incidência de estresses por calor e doenças respiratórias em pessoas que vivem em áreas urbanas.

O aquecimento global também teria um impacto grande na vida das plantas. Árvores de grande porte seriam particularmente vulneráveis às mudanças climáticas. Isso porque muitas crescem durante um período prolongado de tempo antes de começarem a se reproduzir. Além disso, muitas espécies têm uma capacidade limitada de dispersão, comumente espalhando as sementes apenas a curtas distâncias. No fim das contas, as mudanças climáticas podem ser rápidas demais para que espécies com um tempo de geração prolongado consigam evoluir adaptações.

De resto, a fuga para novos hábitats pode ser prejudicada pela presença de barreiras naturais, como montanhas, rios, oceanos, cidades etc. Nesse sentido, árvores de grande porte que vivem em ilhas enfrentarão uma situação duplamente preocupante: o tempo de geração prolongado e as barreiras à dispersão. Nessas circunstâncias, muitas populações deverão desaparecer. Mesmo a estratégia de criar unidades de conservação para proteger populações (vegetais e animais) ameaçadas de extinção pode não ser suficiente para enfrentarmos com sucesso todas as ameaças que um aquecimento global representaria.

Além de desafios novos que encontraremos em futuro próximo, alguns estudos têm mostrado que certas plantas já estão respondendo (em termos evolutivos) às mudanças climáticas. Na Inglaterra, por exemplo, uma espécie de gerânio está antecipando o início da floração em cinco semanas para cada elevação de um grau centígrado na temperatura média anual. Na América do Norte, observações com o indigo (Syringa) e a madressilva (Lonicera) mostram que essas plantas estão florescendo sete dias mais cedo do que o faziam em 1950, quando as observações começaram. Plantas européias estão agora florescendo seis dias mais cedo do que fizeram em 1960 e a estação de crescimento delas tem se prolongado por mais uma ou duas semanas.

Como se não bastasse tudo isso, vale lembrar que muitas plantas dependem da presença de visitantes especializados, sem os quais a polinização das flores simplesmente não ocorre. Com a antecipação do florescimento, a sincronia entre plantas e polinizadores pode ser quebrada. Sem o polinizador certo na época apropriada, os óvulos deixarão de ser fertilizados e as sementes não serão mais formadas. Algo semelhante pode ocorrer entre a planta e os animais que fazem a dispersão de suas sementes.

Para atacar esses problemas de frente, teremos de adotar medidas que reduzam de modo efetivo o volume de gases-estufas que estão sendo despejados anualmente. Caso contrário, o clima continuará mudando depressa demais, ameaçando a sobrevivência de espécies vegetais e animais. Além, claro, de nossa própria espécie.


M. Eiterer





5 de abr. de 2011

Marcando plantas


Encontramos muitas plantas interessantes para observar em um jardim. Podemos observar uma planta como um todo ou apenas partes dela, como flores ou folhas, por exemplo.  A observação pode levar apenas um dia, mas também pode se estender por meses. Se, no jardim existem muitas plantas, encontrar qual planta estavamos observando pode ser uma tarefa difícil.  Precisamos marcar as plantas para a observação. Sem uma marca a confusão é inevitável. Vamos aprender a marcar plantas e partes dela para observação. Vamos precisar de: fita crepe, linhas coloridas (as de bordar ponto cruz são ótimas), caneta permanente e um caderninho para anotar as observações.

Marcando a planta (indivíduo)




Escolha a planta. Passe um pedaço de fita crepe entorno do caule da planta. Na fita crepe anote (com a caneta permanente): a data da marcação e o número do indivíduo (no caso de observar mais de um indivíduo). Pronto, agora você sabe qual indivíduo  está observando no  seu jardim e que dia começou a observá-la. Anote toas as informações em um caderno, não confie na sua memória.
Marcando partes de uma planta


Depois de marcado o indivíduo,  marcamos a estrutra que iremos observar. Vamos usar como exemplo a flor, mas podemos marcar folhas e frutos da mesma forma. Uma planta pode produzir muitas flores, se não marcamos qual estamos observando, no outro dia...será uma confusão. Uma linha colorida amarrada no pedúnculo da flor ajuda na identificação. Para que  identifique as flores observadas de forma rápida e precisa, podemos colar um pedaço de fita crepe na ponta da linha. Na fita crepe anote o nome, numeração ou se está trabalhando com alunos em uma escola,  anote o nome do aluno ou do grupo que está observando e a data que foi iniciada a observação . Mantenha a marcação até o fim das observações.


Agora podemos observar a longevidade de uma flor ou a mudança de cores de uma flor ou, o período de formação de um fruto ou, a longevidade de folhas, por exemplo. Tenho certeza que você irá descobrir coisas muito interessantes para observar no seu jardim.


M. Eiterer

Se você tiver quaisquer comentários, perguntas ou sugestões sobre qualquer coisa relacionado com este texto, deixe-me um comentário, ou apenas um olá.


3 de abr. de 2011

A casa da cascata

Fonte da foto: Wikipédia
Uma casa integrada ao meio e não ao contrário. Uma das mais famosas casas do mundo. A "Casa da Cascata" ou "Casa Kaufmann" foi construída em Montes Allegheney, Estado da Pensilvânia, Estados Unidos da América, em 1936.  Foi desenhada em 1934 pelo arquiteto  Frank Lloyd Wright. Foi erguida, pardialmente sobre uma cascata. Na época, a casa custou 155.ooo dólares.
M. Eiterer



16 de mar. de 2011

A revolução das plantas secas


Herbário do Museum National d`Histoire Naturelle, em Paris, França. Foto: Wikipedia.
Amostras de material botânico têm sido colecionadas por naturalistas e biólogos há centenas de anos. Coleções de plantas secas - usadas, por exemplo, para documentar a descrição de espécies novas - são chamadas de herbários. A técnica empregada para preparar essas amostras recebe o nome de herborização e é tão antiga quanto simples: podemos secar amostras de material botânico prensando-as entre folhas de papel - jornais velhos, por exemplo.
A herborização foi primeiramente utilizada por ilustradores botânicos, preocupados em preservar as características naturais das plantas que retratavam. Com o barateamento do papel na Europa, após o surgimento das primeiras fábricas, ainda no século XII, o material tornou-se mais acessível, o que facilitou a difusão da herborização e o desenvolvimento dos herbários.
Luca Ghini (1490-1556). Foto: Wikipedia. Luca Ghini (1490-1556), professor de botânica da Universidade de Bologna, na Itália, é considerado o primeiro botânico a usar técnicas de herborização. Seu herbário pessoal data de 1520. Ghini difundiu a técnica entre colegas, além de incentivar o intercâmbio de plantas herborizadas.
Os herbários modernos são verdadeiros repositórios de informação, armazenando coleções de importância local, nacional ou internacional, dependendo da abrangência do material colecionado. Suas funções incluem identificação, pesquisa e educação. Consultando coleções de herbários podemos ter uma idéia da distribuição geográfica e do comportamento (época de floração) das espécies. Mais recentemente, o material herborizado também tem sido usado em estudos moleculares (contagem de cromossomos, análise de DNA, extração de substâncias químicas etc.).

Todo material herborizado é registrado e recebe uma etiqueta com informações padronizadas, tais como: identificação da espécie, local e data de coleta e nome do coletor. Vale notar que nem sempre o coletor é também o responsável pela identificação; ao contrário, o mais comum é que a identificação específica seja feita por um especialista no grupo, anos após o material ter sido depositado no herbário.
Existem hoje cerca de 3,3 mil herbários em todo o mundo. Há um catálogo mundial de herbários, chamado Index Herbariorum, no qual todos eles devem estar devidamente registrados. O maior herbário do mundo está no Musèum National d`Histoire Naturelle, em Paris; foi fundado em 1635 e abriga hoje cerca de 7,5 milhões de exemplares. Para se ter uma idéia, basta dizer que esse total equivale à soma do acervo de todos os herbários brasileiros. O maior herbário brasileiro, que é também o mais antigo, está no Museu Nacional, no Rio de Janeiro. Foi criado por Ludwig Riedel, em 1831, e conta hoje com 500 mil exemplares.
Museu Nacional. Foto: Wikipedia.
Alguns dos mais importantes herbários do mundo estão sendo informatizados, permitindo assim que qualquer pessoa, em qualquer lugar do mundo, tenha acesso aos respectivos acervos via Internet. Esse é o caso, por exemplo, do New York Botanical Garden e do Neotropical Herbarium Specimens, ambos nos Estados Unidos; experimente: Virtual Herbarium.

M. Eiterer




12 de mar. de 2011

O que é um cultivar?



Cultivar é um termo relativamente moderno, derivado da expressão "variedade cultivada", que foi cunhado pelo botânico americano Liberty Hyde Bailey (1858-1954).
Liberty Hyde Bailey. Foto: Wikipedia. Podemos definir cultivar como um conjunto de plantas cultivadas, claramente reconhecidas pela presença de um ou mais caracteres (morfológico, fisiológico, citológico etc.) distintivos hereditários - i.e., caracteres que são transmitidos aos descendentes. O termo não deve ser confundido com "variedade botânica", expressão utilizada para caracterizar uma população natural morfologicamente distinta e de ocorrência geográfica restrita.
Vejamos um exemplo:
Um horticultor cultivando a bromélia Aechmea fasciata descobriu indivíduos com folhas de uma coloração diferente. Ele conseguiu reproduzir a planta e seus descendentes sucessivas vezes, via sementes e mudas, e a característica distintiva permaneceu em evidência. Nesse caso, podemos afirmar que entre os indivíduos de Aechmea fasciata cultivados pelo horticultor surgiu uma nova variedade, reconhecida pela coloração distintiva de suas folhas. Esse novo cultivar deve ser formalmente nomeado e registrado, inclusive para fins de proteção e comercialização.
Aechmea fasciata. Foto: Wikipedia. Aechmea 'Starbrite'. Foto: Wikipedia.
Esse processo de nomeação e publicação de cultivares é regulamentado por um código próprio, o Código Internacional de Nomenclatura para Plantas Cultivadas. Só para as plantas do gênero Aechmea, citado no exemplo acima, existem perto de 400 cultivares registrados e outros continuam sendo registrados a cada ano, de acordo com o Florida Council of Bromeliads Societies.
Para a nomeação de um cultivar, podemos usar uma ou mais palavras vernaculares, em caracteres romanos (nunca em itálico), sempre com a primeira letra em maiúscula e entre aspas simples.
Exemplo: Aechmea fasciata ‘Silver Queen’.
Observe a diferença na escrita do nome da espécie e do cultivar. Alternativamente, pode-se usar a abreviação da palavra cultivar (cv.), dispensando com isso o uso das aspas simples. Assim, teríamos: Aechmea fasciata cv. Silver Queen. O nome de um cultivar pode ser usado após o nome da espécie, como visto acima, ou apenas após o nome genérico, como em Aechmea ‘Silver Queen’.
No Brasil, há um sistema nacional de registro de cultivares de sementes e mudas, notadamente para fins de comercialização, o chamado Registro Nacional de Cultivares, realizado pelo Serviço Nacional de Proteção de Cultivares, repartição vinculada ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.


M. Eiterer



9 de mar. de 2011

Vamos deixar o mato crescer

Entra ano, sai ano e as manchetes reaparecem na imprensa: ‘Moradores reclamam de mau cheiro do córrego que corta o bairro’, ‘Moradores pedem capina de mato que atrai cobras e ratos’, ‘Moradores reivindicam canalização de córrego’ e assim por diante. As frases podem até variar, mas expressões como ‘mau cheiro’, ‘ratos e cobras’ e ‘mato’ são recorrentes.

Não há porque duvidar que essas coisas incomodam ou de fato atormentam a vida dos moradores. Isso não significa dizer, no entanto, que as providências solicitadas – ‘cortar o mato’ ou ‘canalizar o córrego’ – sejam soluções efetivas. Talvez fosse o caso de perguntar antes: afinal, qual é a origem desses problemas?

Muitas cidades são a versão contemporânea de aglomerados humanos que surgiram e prosperaram às margens de um corpo d’água, na maioria das vezes um rio.

Além de atender necessidades humanas óbvias (fontes de água, por exemplo), morar nas proximidades de um rio já foi tido como sinal de fartura e prosperidade. Hoje em dia, no entanto, muitas cidades brasileiras têm vergonha de seus rios, preferindo escondê-los.

A razão para isso é quase sempre a mesma: transformamos os rios em escoadouros de dejetos, restos e lixo em geral, convertendo-os em esgotos a céu aberto.

Foi assim no rio Tietê, em São Paulo, no Capibaribe, em Recife, e no Paraibuna, em Juiz de Fora. De um modo geral, os rios que atravessam grandes cidades brasileiras se caracterizam pelas águas contaminadas e o mau cheiro.

Como uma tentativa de contornar essa situação, surgiu a Lei das Águas (lei federal no. 9.433, de 9/1/1997). A lei estabelece um prazo para que os municípios brasileiros enfrentem e, quem sabe, comecem a reverter a situação preocupante em que se encontram suas fontes e cursos d’água.

Alguns políticos e planejadores urbanos têm falado na construção de grandes estações de tratamento de esgoto. Infelizmente, porém, construir uma estação dessas ainda custa caro. Mas há alternativas menos custosas – e talvez mais efetivas – que poderiam desde já ser implementadas.

Uma alternativa envolveria a captação e tratamento do esgoto na própria unidade domiciliar, procedimento esse cuja adoção poderia ser estimulada pelos governantes, envolvendo, por exemplo, a redução ou até mesmo a suspensão de certos impostos para quem tratasse o seu próprio esgoto.

Com isso, poderíamos entrar, quem sabe, em um círculo virtuoso: reduzindo a emissão de esgoto doméstico, favorecemos a restauração da vida aquática o que, por sua vez, pode levar ao embelezamento da paisagem e à recuperação de áreas urbanas hoje desvalorizadas ou em franca decadência.

Em um cenário de recuperação como esse, seria possível, entre outras coisas, começar a desfazer antigas canalizações de córregos (o que já ocorre em cidades da Europa, por exemplo), ao invés de pensar em promover novas (e absurdas) canalizações.

Um outro problema bastante comum envolve o descarte de lixo em cursos d’água, procedimento que muitas vezes reflete a desinformação ou apenas o estado de espírito de seus agentes.

Despejar lixo doméstico a céu aberto equivale a dar um tiro no próprio pé. Se não, vejamos: a parcela orgânica do lixo – restos de comida, por exemplo – serve de alimento para uma ampla variedade de animais urbanos, alguns dos quais dificilmente são bem-vindos na casa de alguém, como é o caso de moscas, baratas e ratos.

Esses consumidores primários, por sua vez, servem de alimento para animais de níveis tróficos superiores, como é o caso de escorpiões e serpentes que se alimentam de baratas e ratos, respectivamente.

Não custa enfatizar: escorpiões e serpentes não aparecem em terrenos baldios por causa de lixo ou do ‘mato’ que eventualmente prospera, mas sim por causa de outros animais, muito mais numerosos e oportunistas, que chegaram antes ao lugar, atraídos que foram pelas refeições grátis fornecidas por moradores humanos.

O pior de tudo é que esse círculo vicioso prospera com freqüência mesmo em bairros regularmente atendidos pelo serviço de coleta de lixo. Não jogar lixo a céu aberto seria, portanto, uma regra de ouro para quem vive em aglomerados urbanos e não quer continuar cultivando problemas desse tipo.

O ‘mato’ – a vegetação miúda que comumente prospera em terrenos baldios – pouco ou nada tem a ver com o problema.

De resto, cabe lembrar o seguinte: o ‘mato’ que vemos crescer ao longo de córregos e rios urbanos em geral é formado de gramíneas (capins) e algumas outras plantas pioneiras que só prosperam em hábitats abertos, expostos à insolação direta.

Como essas áreas são foiçadas ou capinadas todos os anos, as plantas pioneiras – cuja ‘força’ está armazenada na raiz subterrânea – sempre voltam a crescer rapidamente, sem maiores problemas. Nesse sentido, a capina é um outro exemplo de tiro no próprio pé. Vejamos por quê.

As prefeituras podem continuar deslocando funcionários e alocando recursos para o serviço de capina, a exemplo do que o governo federal e os governos estaduais fazem com certa freqüência ao longo de rodovias federais e estaduais.

Há, porém, alternativas inteligentes e inteiramente gratuitas. Uma delas: permitir que a sucessão ecológica prossiga ao longo das margens.

Como? É simples: evitando o corte de arbustos ou árvores jovens que estejam crescendo em meio ao capinzal. Ao contrário das gramíneas e outras plantas de crescimento rápido, árvores e arbustos investem uma parcela maior do orçamento na construção e manutenção das partes aéreas (folhas de vida longa, troncos e ramos suberizados etc.) e, por isso mesmo, crescem mais devagar.

O único inconveniente do corte seletivo é que ele é mais demorado, pois será necessário prestar atenção ao que se corta – não dá para simplesmente passar a foice sem olhar.

Ao fim de um ou dois anos, no entanto, a diferença já poderá ser notada. E, nesse caso, teremos trocado um círculo vicioso por um círculo virtuoso: à medida que arbustos e árvores prosperam (quer seja às margens de rios, córregos ou rodovias), a vegetação pioneira perde ‘força’.

Como gramíneas e outras plantas pioneiras são intolerantes ao sombreamento, à medida que a vegetação arbórea ganha altura, a vegetação miúda do estrato inferior cresce menos ou mesmo desaparece.

Após três ou quatro anos de corte seletivo, ao invés de um denso capizal, teremos fileiras de arbustos e árvores em crescimento. A partir de então, precisaríamos apenas manejar essa vegetação, mas nunca mais teríamos de gastar tempo e recursos com o serviço de capina.

EITERER, M. & COSTA, F. A. P. L. 2007. Vamos deixar o mato crescer! Jornal da Ciência 3280. 

Felipe A. P. L. Costa é autor de 'Ecologia, evolução & o valor das pequenas coisas' (2003) e 'A curva de Keeling e outros processos invisíveis que afetam a vida na Terra' (2006).




6 de mar. de 2011

O nome da planta

A denominação de uma planta é chamada de nomenclatura botânica. A nomenclatura botânica segue os princípios e normas do Código Internacional de Nomenclatura Botânica (ou ICBN do nome em inglês, International Code of Botanical Nomenclature). O objetivo do código é apresentar métodos estáveis de nominação, prevenindo e refutando o uso de nomes que gerem erros, ambigüidade ou confusão evitando, assim, a criação desnecessária de nomes. As normas do código, no entanto, estão sujeitas a modificações e são periodicamente discutidas em congressos internacionais de botânica. 
O nome científico das plantas é formado basicamente por duas palavras. O sisteSpecies plantarum. Foto: Wikipediama binomial foi usado de modo consistente pela primeira vez por Carl von Linné (1707-1778), em seu livro Species Plantarum, de 1753. No sistema binomial, a primeira palavra é um substantivo e designa o gênero da planta; a segunda é um adjetivo e é chamada de epíteto específico. O epíteto específico pode fazer referência a uma característica (morfológica, geográfica, química etc.) notável da planta ou ser uma homenagem a alguém. Por exemplo, Allagoptera arenaria é o nome científico de uma palmeira que cresce em terrenos arenos, daí o nome arenaria. Já os epítetos de Ipomoea coccinea e Ipomoea purpurea fazem alusão à cor vermelha e púrpura de suas flores, respectivamente. Por fim, o epíteto específico de Monstera adansonii é uma homenagem a Michel Adanson (1727-1806). 

Quando queremos comunicar ou buscar informações fidedignas sobre algum tipo de planta, devemos antes conhecer o seu nome científico. Não basta, nessas horas, conhecer o nome popular da planta; e há bons motivos para isso. O nome popular em geral está limitado a um determinado idioma - o nome popular de uma planta em português dificilmente seria o mesmo em inglês, por exemplo. Além disso, dentro de um país tão grande e com tanta diversidade cultural como é o nosso, os nomes populares de uma mesma planta podem variar de região para região. Assim, uma mesma espécies de planta pode receber diferentes nomes ou então um mesmo nome pode ser aplicado a diferentes espécies botânicas. Dependendo da região, "cambará" pode ser Lantana camara (Verbenaceae), Vernonia laevigata (Asteraceae ou Compositae), Gochnatia polymorpha (Asteraceae ou Compositae) ou Vochysia divergens (Vochysiaceae) - nesse caso, um mesmo nome está sendo aplicado não só a plantas de espécies diferentes, mas a plantas de famílias botânicas diferentes. Ademais, muitas plantas que não chamam a nossa atenção ou não têm importância econômica carecem de nomes populares. É o uso de um sistema internacional de nomenclatura botânica que confere estabilidade e precisão ao intercâmbio de informações sobre plantas entre pessoas do mundo inteiro.


M. Eiterer




20 de fev. de 2011

A rainha das formigas

Anfisbenas

Amphisbaena alba. Foto:M.Eiterer.
Um animal que adora comer formigas. O sonho de todo jardineiro ou agricultor. Esse animal existe, mas ele é morto por pessoas que, por causa do corpo alongado, acham que é uma serpente.  Seu nome é Amphisbaenea alba. As anfisbenas não são serpentes. Elas são inofensivas.
As anfisbenas são répteis parentes dos lagartos e das serpentes. A maioria das espécies são encontradas na América do sul e na África. A palavra anfisbena é de origem grega, que significa “que vai em duas direções”, pois ela conseguem andar de marcha à ré. Elas também são conhecidas por cobra-de-duas-cabeças ou cobra-cega ou rainha das formigas. Ela cava túneis com a cabeça que é muito forte. Possui um par de olhos bem pequenos e embutidos protegidos por uma pele. É quase cega, mas sua audição e olfato são excelentes. Quando ameaçada levanta a cabeça, ao mesmo tempo a ponta da cauda e abre a boca. Fazem isso apenas para assustar. Ela não é peçonhenta.
Podemos ver as anfisbenas quando elas saem para caçar e em dias muitos chuvosos, quando suas galerias ficam inundadas.É carnívora, come insetos e preferem as formigas cortadeiras. Por isso, o nome rainha das formigas. Coloca ovos na superfície do solo, mas há algumas espécies vivíparas.
Eu fico muito feliz quando encontro uma anfisbena no meu jardim. Vou logo mostrando a entrada de algum formigueiro, em pouco tempo ela desaparece dentro dele. O indivíduo que ilustra esse texto foi encontrada por meu filho de apenas 12 anos. Ele já está familiarizado com as anfisbenas e sabe que elas ajudam a controlar as populações de formigas do nosso jardim.

M. Eiterer





14 de jan. de 2011

A ave e o mosquito

 A história de como o pardal chegou no Brasil

São duas histórias que se confundem, a de uma pequena ave e a de um mosquito. Ambos exóticos, isto é, espécies introduzidas em uma área onde não existiam originalmente. Eles foram  introduzidos no Brasil em momentos e de formas diferentes, mas os dois colonizaram rapidamente o território brasileiro. Vou começar pelo mosquito porque ele chegou primeiro. Nossa briga com ele não é de hoje. Sim, ele mesmo! O tão falado Stegomyia aegypti. Ele chegou ao Brasil no século XVII. Ficou surpreso?  Espere então até ouvir o resto dessa história.
Aedes aegypti. Foto: wikipedia.
Stegomyia aegypti chegou aqui de navio, por volta de1685, quando ocorreu a primeira epidemia de febre amarela. Isso mesmo! Ele chegou de navio! O Stegomyia aegypti chegou pelo porto de Recife (Pernambuco).  O Stegomyia aegypti não consegue voar grandes distâncias, poucas vezes seu voo  excede os 100 metros. Assim, é mais provável que o mosquito passe toda sua vida nas proximidades do local  onde nasceu.  O Stegomyia aegypti consegue alcançar grandes distâncias nas fases de larva e ovo, quando transportados em recipientes. O que provavelmente aconteceu com os navios que chegavam aqui naquela época. Nós transportamos o Stegomyia aegypti de um lugar para outro. Um ano depois já estavam na Bahia causando uma epidemia de febre amarela com muitas mortes. Mas somente em 1898 é que foi comprovado que ele era o transmissor da febre amarela e apenas no início do século vinte  que foram adotadas medidas específicas contra o Stegomyia aegypti. O Rio de Janeiro só se veria livre da febre amarela em 1909. E a dengue? Nosso maior temor nessa época era a febre amarela, a dengue só começaria a nos assombrar em 1923 e 1982. O outro personagem dessa história, a ave, foi introduzida em 1906. Já sabemos que ela foi introduzida no Brasil por causa do mosquito e da febre amarela. Mas, que ave é essa? De onde ela veio?

No Brasil, existem muitas aves comedoras de insetos, como o bem-te-vi ou as andorinhas,  por exemplo. Mas mesmo assim, em 1906, foram trazidos 200 indivíduos de uma espécie de ave, de Leça da Palmeira, Portugal, para o Rio de Janeiro, para combater o mosquito Stegomyia aegypti  A tal ave não era portuguesa e sim de origem asiática. Rapidamente espalhou-se pelo Brasil. Assim como o mosquito, ela se tornou comum. Há até quem ache que é uma ave brasileira. Apenas cinquenta  e quatro anos depois,  de sua introdução, o Ministério da Agricultura já criava uma portaria colocando essa pequena ave no topo da lista de animais nocivos para o país,  seguido pelos morcegos hematófagos e ratos.  Hoje, ele é, provavelmente, a terceira ave mais numerosa no mundo, a galinha doméstica (Gallus gallus)  é a primeira seguida do  estorninho (Sturnus vulgaris). Próximo a  sua casa deve ter um bando deles, pois o pardal é gregário, isto é, vive em bandos. 
 Pardal macho (Passe domesticus). foto: M.Eiterer.

Há quem torça o “bico” quando ouve o nome dessa pequena criatura de apenas 30 g. Pardal. Ele mesmo! O  pardal. Seu nome científico é Passer domesticus. Inteligente. Atento. Desconfiado. Percebe quando é perseguido e  some. Ele vive nas  cidades,  sempre perto de casas e  depende do ser-humano para sobreviver. O pardal faz seu ninho em beirais, fendas e buracos de nossas casas. Seus inimigos não são poucos: ratos, gambás, morcegos, corujas, gaviões são alguns deles. Em cativeiro chega a viver 23 anos.

O pardal não se alimenta exclusivamente de  insetos, seu bico é projetado para esmagar grãos. Ele  é um onívoro. Os machos e as fêmeas são diferentes. O macho tem um babador preto, a testa e o alto da cabeça cinzas e o dorso acastanhado com marcas escuras. As fêmeas não possuem babador preto, sua plumagem é marrom clara e tem uma sobrancelha branca que vai do olho até a nuca. A voz do pardal é rouca e barulhenta.
Stegomyia aegypti foi considerado erradicado do Brasil por duas vezes .  A primeira em 1955. Mas, ele voltou pouco tempo depois em 1967, novamente pela costa, em Belém (Pará). Foi erradicado pela segunda vez em 1973. Então, é possível erradicar o mosquito? Sim. Mas não conseguimos evitar sua reintrodução, pois ele foi reintroduzido em 1976, novamente por um porto, agora em Salvador (Bahia). E, o pardal? Cento e quatro anos depois de sua introdução deliberada,  o pardal tornou-se um animal antipatizado. Chegou aqui como um herói, hoje é um invasor rechaçado.  Agora você conhece a história do pardal e do Stegomyia aegypti, história onde nós somos os personagens principais. 

 Fontes

COSTA,  Felipe A. P. L. Qual é o nome do mosquito? Observatório da Imprensa, edição 737. Disponível em <http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/qual_e_o_nome_do_mosquito>. Acesso em: 20/03/2013.

MINISTÉRIO DA SAÚDE.  Manual de vigilância epidemiológica da febre amarela. Brasília: Ministério da Saúde: Fundação Nacional da Saúde, 1999.

SICK, Helmut. Ornitologia brasileira. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001.