"Desde o momento em que nascemos somos exploradores, num mundo complexo e cheio de fascínio. Para algumas pessoas, o interesse pode desaparecer com o tempo ou com as pressões da vida, mas outras têm a felicidade de mantê-lo vivo para sempre."
Gerald Durrell

9 de fev. de 2014

Por que devemos plantar espécies nativas


Efeito dominó. Arte por David Pendleton.

Efeito dominó no jardim
 Quando visito um amigo sempre ganho uma muda de alguma planta, assim posso dizer que meu jardim é pessoal e guarda muitas histórias e lembranças. Mas, ultimamente ando muito preocupada com que planto no meu jardim. Por quê? Por causa da biodiversidade. As plantas que uso no meu jardim podem alterar a biodiversidade da minha região, criando um efeito dominó, levando a redução de populações tanto de animais quanto de plantas e contribuindo para a extinção desses organismos. 

Exóticas versus nativas  
Porque estamos acostumados a ver determinadas plantas em jardins locais, não quer dizer que elas são nativas. Nós plantamos em nosso jardins muitas plantas exóticas, isto é, que não ocorrem naturalmente em nossa região, a maioria são oriundas da Ásia, Europa ou África. A hortênsia ( Hydrangea macrophylla), por exemplo, é uma planta nativa do Japão e China, onde ela ocorre naturalmente. Aqui no Brasil ela é uma planta exótica. Nós escolhemos essas plantas geralmente por causa de sua beleza e disponibilidade. Mas, nunca pensamos o quanto elas podem afetar outros organismos. Até agora.

Plantas que fogem do jardim 

Algumas plantas ornamentais exóticas podem ser também invasores e são um grande problema para os conservacionistas ( leia também 'Plantas que fogem do jardim'). Um exemplo de uma planta ornamental exótica e invasora que tem dado muito dor de cabeça é o beijo-do-brejo (Hedychium coronarium). Plantas invasoras tem recebido grande atenção por causa do seu impacto sobre as plantas nativas e animais, ao contrário das plantas ornamentais exóticas não invasoras. Entretanto, isso tem mudado nos últimos anos. Agora estamos também interessados em saber que efeito os jardins formados por plantas exóticas tem sobre nossa biodiversidade. E o que descobrimos foi uma sucessão de problemas.

Plantas e insetos, as primeiras peças começam a cair  

No nosso jardim devemos encontrar um grande número de insetos. Se você não está encontrando insetos no seu jardim, isso deve deixá-lo preocupado e não feliz. A maioria dos insetos herbívoros podem reproduzir com sucesso, somente sobre plantas que eles tem compartilhado uma história evolutiva. Com raras exceções, insetos herbívoros não podem adaptar-se rapidamente a novas plantas. Isso porquê os insetos herbívoros não conseguem desenvolver adaptações fisiológicas instantâneas para conseguir comer determinadas plantas sem passar mal ou morrer com isso. Borboletas, por exemplo, colocam seus ovos em plantas ou grupo de plantas que reconhecem quimicamente e as larvas que nascem desses ovos alimentam-se exclusivamente dessas plantas, escolhida pela mãe-borboleta. Algumas ainda conseguem uma defesa química contra predadores. Se, essa planta ou grupo de plantas desaparecem do local, as borboletas não tem onde colocar os seus ovos e mesmo que as larvas nasçam elas não terão o que comer. Assim, a população irá reduzir ou mesmo desaparecer. Um bom exemplo e a borboleta monarca, que identifica e coloca ovos em plantas do gênero Asclepias, cujas folhas serão comidas pelas larvas que nascerão dos ovos e dão a monarca uma defesa química contra predadores. 

Sendo assim, é esperado que em jardins formados por plantas exóticas não tenham a mesma quantidade e diversidade de insetos como os jardins formados por plantas nativas. Pois os insetos nativos buscam aquelas plantas também nativas com as quais compartilharam uma mesma história evolutiva.

 Aves, derrubando mais peças  
Num jardim podemos encontrar muitas espécies de aves, principalmente insetívoras, ou seja, aquelas que comem insetos e mesmo frugívoros que tem na dieta de seus jovens proteínas vinda de insetos. Sem insetos o que essas aves irão comer? A redução de insetos pode ter importantes implicações sobre a conservação das aves.Retirando as espécies nativas de plantas e introduzindo espécies exóticas reduzimos as populações e espécies de insetos e por conseguinte de aves.

Este foi apenas um pequeno exemplo de como é intrincado as relações dos organismos que vivem nos jardins e as consequências da nossa interferência nessa cadeia. Muitas outras peças podem entrar nesse jogo como os anfibios ou até mesmo o solo e os microorganismo que nele vivem. Nossa interferência pode ser muito maior do que está descrito nessas poucas linhas.

Além de favorecer os insetos, aves e outros animais nativos, as plantas nativas também estão melhor adaptadas para crescer no seu local de origem. Assim você terá menos problemas com pragas e doenças, o que significa menos gastos na manutenção do seu jardim. Pense nisso. Escolha as plantas nativas.
M.Eiterer


 

Fonte
Burghardt, Karin T.; Tallamy, Douglas W. and Shriver, W. douglas. 2008. Impact of native plants on bird and butterfly biodiversity in suburban landscapes. Conservation biology, 23:219-224.


The New York botanical Garden. 2012. Bringing Nature Home: What You Can Do. disponível em <http://www.nybg.org/plant-talk/2012/02/wildlife/bringing-nature-home-what-you-can-do/>. Acesso em: 9/02/2012.

M.Eiterer é bióloga/botânica. Adora jardins e plantas desde crianças, já plantou tantas árvores que perdeu a conta.Escreve também para o blog Aves de Viçosa. Leia o perfil completo.

4 comentários:

  1. Meu quintal é um misto de jardim e zoológico. Tenho verificado mesmo que a borboleta monarca não deixa meu pé de manacá em paz. Tanta coisa prá ela comer e vai logo no meu único pé de manacá, que eu adoro. Faço uma seleção, é claro, e quando vejo, deixo só as lagartas maiores, porque elas já comeram mesmo, e logo vão "crisalidar'... Se eu descuidar, não sobra nada nem para as pequeninas, afinal ele não é tão grande assim. Os grilos sumiram daqui, agradeço aos pássaros que sabidamente atraio com canjiquinha, frutas e água. O joão-de-barro e as rolinhas andam atrás de mim, quando vou cavucar o chão. Mas o que mais me chateia é ver um galo-do-campo pegar um filhote de rolinha, ou de saíra. Até corro atrás... mas ainda não sei voar...

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    1. Um jardim deve ter essas interações. Não é mesmo Fátima?. Há muitos anos atrás em uma de minhas residências tive um pé de Manacá que eram atacados por lagartas de uma borboletas que precisa da planta para colocar seus ovos. Eu nunca retirei ou matei as lagartas, meus vizinhos ficavam chocados com minha atitude. Mas, meu Manacá depois de perder suas folhas ficava totalmente coberto de flores. Algo realmente maravilhoso.

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  2. Bom dia
    Na minha residência tenho vários pequenos jardins com plantas exóticas, mas sei que o verdadeiro jardim é uma área de mata nativa, onde praticamente não entramos, nem roçamos. É bem do lado da casa, e beirando essa mata vemos tatus, lebres, bugios, cobras, borboletas, pássaros, vespinhas, etc. É nesse jardim nativo que a vida floresce!
    Estou adorando ler os seus artigos!
    Oriane N. Baum
    Campo Alegre/SC

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    1. Olá, Oriane! Fico feliz que tenha gostado do texto. No nosso jardim podemos conservar espécies nativas e manter a biodiversidade local. Sempre dê preferência as espécies nativas no seu jardim. Ter uma floresta inteira para cuidar é meu sonho. Um grande abraço, Marinês.

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